terça-feira, 30 de setembro de 2014

A Música Indígena no Brasil e a Arte de Marlui Miranda

Índios Tupinambá
Embora não se saiba com exatidão a quantidade de indígenas que habitavam Pindorama (nome tupi para a região que hoje se compreende como Brasil) antes da invasão, pesquisadores apontam um número de 4 a 5 milhões de índios de diversas etnias. Essas populações foram massacradas tanto por armas de fogo quanto por doenças trazidas pelos brancos europeus, e continuam sendo pelas mãos de garimpeiros e fazendeiros. Mas a ancestralidade desses povos permanece viva pela arte, e entre as expressões artísticas citamos em especial a música.

A música indígena é fundamentalmente baseada no canto, porém também existem variedades instrumentais. O índio faz música para exaltar a natureza rica que o rodeia, para socializar com os demais moradores da tribo e entrar em contato com o mundo espiritual, transformando esta arte em uma experiência transcendental. Ao escutar um canto indígena pela primeira vez podemos relacioná-lo à música árabe e indiana nas quais a voz é também imprescindível.

O grupo indígena de rap Brô Mc's
Porém a música indígena não é estática, ela não permanece em sua totalidade a mesma desde a época da invasão europeia. Não é difícil encontrar índios que fazem música indígena com a mistura de outros ritmos. Um exemplo disso é o grupo Brô Mc’s composto por quatro jovens guarani-kaiowá que cantam rap em português e guarani. Clemerson Veron, um dos integrantes do grupo já prevendo a xenofobia e racismo que sofreria mandou o seu recado - “A nossa cultura é o nosso rosto, a nossa pintura, a nossa pele, nossa cor, nossas músicas, nossa língua. Não deixamos a nossa cultura quando cantamos rap”.

Entre os não-indígenas que fazem música indígena podemos citar alguns nomes na cena brasileira como Gilberto Gil, Tetê Espíndola, Geraldo Espíndola e Gaby Amarantos, mas nenhum deles se dedicou tão intensamente à cultura indígena como a cearense Marlui Miranda.


Índios Guarani cantando para Nhanderú
Marlui, natural de Fortaleza, é casada com o fotógrafo Marcos Santilli, que entre outras colaborações para os povos indígenas foi o realizador do projeto Nharamaã nos anos 70 que registrou as mudanças humanas e ambientais ocorridas na Amazônia. O projeto continua a ser desenvolvido.

Se a cantora não tivesse vencido
um festival de música estudantil lá em 1968 talvez ela não fosse hoje a maior estudiosa e intérprete de música indígena no Brasil. Na época Marlui estudava arquitetura, mas isso não a impediu que seu amor pela música e pelas expressões artísticas indígenas falassem mais alto e a fizessem mudar o curso de sua vida. Após se formar em arquitetura em Brasília, Marlui se mudou para o Rio de Janeiro onde estudou violão e começou ase apresentar com grandes artistas da época, entre eles Milton Nascimento, Taiguara, Jards Macalé e Egberto Gismonti.

Olho D´Água (1979)
Foi também nesses anos de grande furor e estudo da música indígena que Marlui começou a se interessar na luta pelos direitos desses povos explorados desde a chegada do homem branco. Seu primeiro álbum solo foi lançado em 1979. Intitulado Olho D’Água, o LP raríssimo e muito requisitado pelos colecionadores já contava com uma canção indígena, “Grupo Krahõ”. A música é da etnia Krahõ que fica localizada na divisa entre os estados do Maranhão, Piauí e Tocantins e que conta atualmente com aproximadamente 2 mil indígenas.

Família Krahô
Desde então Marlui tem se dedicado a estudar sobre a música e demais expressões artísticas dos grupos indígenas brasileiros e está sempre cotada para participar dos eventos nacionais que tenham como foco os povos originários. Além disso Marlui é também comumente convidada para festivais internacionais de world music.

Seu último trabalho se chama “Fala de Bicho, Fala de Gente” e é novamente inteiramente dedicado à
música indígena como os trabalhos anteriores “Ihu – Todos os Sons” e “2 Ihu Kewere – Rezar”. O novo disco se centraliza na música Juruna, em especial a música de ninar. A cantora foi convidada pelos próprios Juruna para interpretar a sua música e após o trabalho ser finalizado a artista recebeu elogios muito calorosos de seus amigos indígenas.


Marlui Miranda
Marlui Miranda pode ser considerada para a arte brasileira o que Darcy Ribeiro representa para a antropologia, uma pessoa que através de sua incessante dedicação e verdadeiro amor pelos povos originários teve os caminhos místicos indígenas abertos e foi convidada a transpor a esse mundo paralelo de ancestralidade e espiritualidade.

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